sexta-feira, 9 de setembro de 2011

SE

                                           Brendekilde A Wooded Path Autumn-Hans Anderson

Se podes conservar o teu bom senso e a calma


No mundo a delirar para quem o louco és tu…

Se podes crer em ti com toda a força de alma

Quando ninguém te crê…Se vais faminto e nu,



Trilhando sem revolta um rumo solitário…

Se à torva intolerância, à negra incompreensão,

Tu podes responder subindo o teu calvário

Com lágrimas de amor e bênçãos de perdão…



Se podes dizer bem de quem te calunia…

Se dás ternura em troca aos que te dão rancor

(Mas sem a afectação de um santo que oficia

Nem pretensões de sábio a dar lições de amor)…



Se podes esperar sem fatigar a esperança…

Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho…

Fazer do pensamento um arco de aliança,

Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho…



Se podes encarar com indiferença igual

O triunfo e a derrota, eternos impostores…

Se podes ver o bem oculto em todo o mal

E resignar sorrindo o amor dos teus amores…



Se podes resistir à raiva e à vergonha

De ver envenenar as frases que disseste

E que um velhaco emprega eivadas de peçonha

Com falsas intenções que tu jamais lhes deste…



Se podes ver por terra as obras que fizeste,

Vaiadas por malsins, desorientando o povo,

E sem dizeres palavra, e sem um termo agreste,

Voltares ao princípio a construir de novo…



Se puderes obrigar o coração e os músculos

A renovar um esforço há muito vacilante,

Quando no teu corpo, já afogado em crepúsculos,

Só exista a vontade a comandar avante…



Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre…

Se vivendo entre os reis, conservas a humildade…

Se inimigo ou amigo, o poderoso e o pobre

São iguais para ti à luz da eternidade…



Se quem conta contigo encontra mais que a conta…

Se podes empregar os sessenta segundos

Do minuto que passa em obra de tal monta

Que o minute se espraie em séculos fecundos…



Então, á ser sublime, o mundo inteiro é teu!

Já dominaste os reis, os tempos, os espaços!…

Mas, ainda para além, um novo sol rompeu,

Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos.



Pairando numa esfera acima deste plano,

Sem receares jamais que os erros te retomem,

Quando já nada houver em ti que seja humano,

Alegra-te, meu filho, então serás um homem!…



RUDYARD KIPLING

Desejo

                                                       Onze da manhã- Edward Hoper

Desejo primeiro que você ame,

E que amando, também seja amado.

E que se não for, seja breve em esquecer.

E que esquecendo, não guarde mágoa.

Desejo, pois, que não seja assim,

Mas se for, saiba ser sem desesperar.



Desejo também que tenha amigos,

Que mesmo maus e inconseqüentes,

Sejam corajosos e fiéis,

E que pelo menos num deles

Você possa confiar sem duvidar.

E porque a vida é assim,

Desejo ainda que você tenha inimigos.

Nem muitos, nem poucos,

Mas na medida exata para que, algumas vezes,

Você se interpele a respeito

De suas próprias certezas.

E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,

Para que você não se sinta demasiado seguro.



Desejo depois que você seja útil,

Mas não insubstituível.

E que nos maus momentos,

Quando não restar mais nada,

Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.



Desejo ainda que você seja tolerante,

Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,

Mas com os que erram muito e irremediavelmente,

E que fazendo bom uso dessa tolerância,

Você sirva de exemplo aos outros.



Desejo que você, sendo jovem,

Não amadureça depressa demais,

E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer

E que sendo velho, não se dedique ao desespero.

Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e

É preciso deixar que eles escorram por entre nós.



Desejo por sinal que você seja triste,

Não o ano todo, mas apenas um dia.

Mas que nesse dia descubra

Que o riso diário é bom,

O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.



Desejo que você descubra ,

Com o máximo de urgência,

Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,

Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.



Desejo ainda que você afague um gato,

Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro

Erguer triunfante o seu canto matinal

Porque, assim, você se sentirá bem por nada.



Desejo também que você plante uma semente,

Por mais minúscula que seja,

E acompanhe o seu crescimento,

Para que você saiba de quantas

Muitas vidas é feita uma árvore.



Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,

Porque é preciso ser prático.

E que pelo menos uma vez por ano

Coloque um pouco dele

Na sua frente e diga "Isso é meu",

Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.



Desejo também que nenhum de seus afetos morra,

Por ele e por você,

Mas que se morrer, você possa chorar

Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.



Desejo por fim que você sendo homem,

Tenha uma boa mulher,

E que sendo mulher,

Tenha um bom homem

E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,

E quando estiverem exaustos e sorridentes,

Ainda haja amor para recomeçar.

E se tudo isso acontecer,

Não tenho mais nada a te desejar ".


Victor Hugo